quinta-feira, 31 de março de 2011

"Para sair, diga a senha".

À espreita, a raposa circunda. Ela receia uma aproximação. Eu faço de conta que não percebo.

Viajo à noite, entranhado nas brumas da madrugada, mas mesmo assim há encontros inesperados. Seres da noite procuram ocupação.

Alienígena àquele ambiente sinistro, uma mulher carrega sua filha, enrolada em muitos trapos. Ela nota minha portentosa presença e vem ao meu encontro.


Desconcertado, mostro indiferença e continuo no meu caminho. Entretanto, ela ignora meu desdém.

Senhor?

Meus olhos insistentemente apontam para o lado contrário.

Senhor? Por favor...

Então a criança soluça baixinho.

Não resisto a esta frágil demonstração de carência. Abalo-me quando o assunto trata de crianças.

Sim?

Ela esmiuça um sorriso.

Eu sou a flor silvestre que perfuma os campos.

Como?

Eu sou a flor silvestre que perfuma os campos.

Sim, eu a entendi. O que não cabe aqui é esta frase. Por que tais estranhos dizeres?

É uma senha.

... Sim, e daí?

Você tem que responder com a contra-senha.

Por quê?

Porque é assim que tem que ser.

Quem pode afirmar isso?

Qualquer um que more por aqui.

Desculpe, senhora. Não estou a par destas formalidades. Na verdade, estou indo embora. Por isso, com sua licença...

Espere! Você precisa falar a contra-senha... É preciso...

Hum... Está bem. Mas precisarei de ajuda aqui.

Certo... Você responde: "Eu te amo".

Hã?!?!? Não posso dizer isso!

Por favor...

Como num complô, a criança resolve soluçar mais uma vez.

Está bem!

Então vamos lá, do início: "Eu sou a flor silvestre que perfuma os campos".

"Eu te amo".

"Aqui está sua filha!"

E como um objeto ínfimo, a mulher lança o bebê que carregava nos meus braços. Antes que pudesse esboçar qualquer reação, ela já tinha desaparecido.

E não bastando isso, ainda sou obrigado a ouvir uma voz canídea que afirmava:

"Se tivesse comprado a poção, nada disso teria acontecido..."

Nenhum comentário:

Postar um comentário