quarta-feira, 24 de agosto de 2011

A queda da valquíria.

O galope repentinamente reverberou por todo o castelo.

Surpreso por este tipo de som surgir da torre três, disparo até lá, mas com precaução.


Quando sinto a brisa do mar balançar os meus cabelos, deparo-me com uma majestosa montaria. Um cavalo com asas! Em suas costas, uma linda figura de esvoaçantes cabelos claros que escapavam do elmo, em cujos lados ostentavam metades de asas que apontavam para o céu; o corpo perfeito coberto por uma reluzente armadura e a aura celestial que pairava entorno deixaram-me completamente anestesiado. Só fui liberto do enebriante êxtase quando a mim foi apontada a lança e a possante voz se fez ouvir:

Tu! Prestai-me atenção! Eis-me que cá estou, perdida de minhas companheiras. Necessito de teu auxílio!

Você é... uma valquíria!

Sim! Serva do pai Odin! Devo regressar pois neste instante trava-se uma batalha em Asgard. Devo regressar para buscar os Einherjar, a fim de reforçar a armada de Odin no Ragnarok. Preciso de ti!

E o que eu posso fazer por você? Nem humano sou...

Disso, tu tratarás. Podes bem principiar dando de beber ao meu cavalo. Depois, veremos...

Só espero que Loki não resolva aparecer.


segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Espinafres em dó maior.



Ei, Frank! Como vai?

Almabane!! Você por aqui!? A que devo a visita tão repentina... Não! A esta invasão?! Como foi que entrou aqui?

A porta estava aberta. Mas ouça, vim aqui apenas para te informar que lancei um blog: Espinafres em Dó Maior. Gostaria que, quando você tivesse um tempo, fizesse uma visita. Lá encontrará diversos tipos de textos, geralmente curtos, de todas as categorias. Exponho sobre tudo, pendendo quase sempre para o surreal. Afinal, não adianta escrever e deixar os escritos guardados a sete chaves, não é mesmo?

O texto torna-se inútil. Uma existência sem propósito.

Não teria dito melhor. Bem, caro Frank, já cumpri minha missão aqui, por isso, Adieu!

E assim vai mais um louco com sua loucura...

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Rapaz! Que dia! Que dia!

Meus olhos lacrimejam; não por estar lendo a mais emotiva manifestação humana (o amor impossível e suas consequências) mas por causa de uma negra e espessa fumaça que invade a torre dois com ímpeto.

A razão de tamanha afronta vinha de baixo. Ao localizar a origem, imediatamente entro em ação:

Moleques dos diabos!!! Quantas vezes já disse para vocês não inventarem de queimar pneu!!!

Acredito que minhas súplicas é a motivação para que eles continuem transformando o pior material, daqueles que emitem o mais fétido cheiro quando incendiados, numa massa disforme de lixo derretido.

Eu ei de pegá-los, malditos!! E quando isso acontecer, não terei piedade.



No outro dia sou acordado com fogos de artifício. Toda a vila estava em polvorosa. Um grande evento desenrolava-se em torno do castelo. Com direito a papéis coloridos recortados, pendurados em linhas que cortavam as barracas montadas sem qualquer planejamento; e pessoas em trajes adequados para a celebração, formando um conjunto harmonioso em meio ao caos. O cheiro forte de fritura despertava a fome dos animais carniceiros que insistiam em rodear a vila em busca de conforto. Em meio ao burburinho festivo, músicas típicas estrondavam e a alegria era geral.

Por um tempo fiquei observando àquilo com interesse. Quando meu pé principiou a bater no ritmo intruso que alcançava a torre, pensei em entrar. Contudo, uma força maior que eu não permitia afastar-me. Fiquei ali, no início analisando, mas por fim, apenas apreciando.

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Aguardar acontecer talvez seja tarde.



Estou há dois dias aguardando Horácio ter coragem de me encarar. Tentei aprofundar-me na arquitetura psicodélica do castelo, mas não tive sucesso em encontrar o Pépe. Aquele quarto misterioso na qual ele vive (não sei como) deve ser mais bem entranhado do que me recordo. Enfim, resta-me esperar alguns dos dois se mostrar.

O que Ranter dissera era de fato o certo. Desde que regressei, todas as manifestações de desordem sumiram. A energia até voltou.

Gostaria de ter ouvido mais histórias dele... Ora, e por que não?! Vou visitar o velho Mathias, talvez ele ainda esteja lá.

Coloco o essencial em uma mochila e sigo para a cabana.

No caminho fico me perguntando o que a raposa estará fazendo com a pistola que lhe dei. Espero que nada contraproducente.

Mas é ao chegar ao meu destino que constato o pior.

Por meu pai! A casa sumiu!

Corro até o local onde ela deveria estar, tentando encontrar qualquer vestígio de que ela realmente esteve lá dias atrás, mas nada acho.

Amaldiçoei a raposa sem pensar se ela era a culpada. Queria apenas descontar em alguém, e a perda da arma ainda não havia sido digerido bem por mim.

Agora, restava apenas voltar para casa.

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Ao ponto de partida.



O retorno sempre é mais célere do que a ida.

Depositei o minúsculo castelo no chão, tomando o cuidado de deixá-lo bem encaixado; calculei de cabeça as reais dimensões dele e fi-lo situar-se no centro do espaço aberto ocasionado por seu súbito encolhimento. Parecia um brinquedo. Afastei-me dele e, ao retirar a pistola de nanicolina, pensei: "Será que ela não irá diminuir ainda mais? Ele poderia ficar numa tamanho subatômico!!" Decidi não arriscar.

E agora?

Psiu. Ei, amigo!

Eu não podia acreditar no que via. Era a raposa comerciante.

Não vai me dizer que tem uma poção que resolva esse impasse.

Não há problema que não possa ser resolvido. E para esta questão, apenas um detalhe deve ser observado.

Qual?

Ora, não nos precipitemos. Uma contribuição pecuniária cairia bem agora...

Ai, eu sabia. E quanto seria?

Não me expressei bem. Na verdade, gostaria de fazer uma troca: a informação por um objeto.

Sim?

A pistola. Dê-me a pistola.

Ensandeceu?! Como poderia desfazer-me de algo tão... tão... periculoso?!?!

Não seja imaturo. Eu garanto que seu castelo restabelecerá suas majestosas dimensões.

Acreditar naquela raposa era difícil. Entregar-lhe uma arma com certeza não era uma atitude sensata. Mas, enfim, estava enrascado mesmo.

Certo. Aqui está.

Ótimo, Frank. Observe...

Havia um botão imperceptível em uma das dobras da pistola. Ele apenas girou-a. Apontando para o castelo, fez uma luz esmeralda fulgurante acertá-la me cheio. Assim, gradativamente, as altas torres novamente cortaram o céu. Tudo voltara a ser como antes.

Satisfeito, a raposa agradeceu a transação e foi-se. Enquanto a mim, recolhi meus pertences e segui para o enorme portão à frente.

Momento conspiratório cultural: Splice.

Que ímpeto é este de criar?

É a vontade de modificar, experimentar, alcançar o nível máximo da mais completa perfeição só atingida por Deus?

Quem é Deus, afinal? O QUE é Deus?

Ah, homem! Adentra em caminhos inexplorados para criar variações de um mesmo tema. Junta o que pode e faz. Imita o criador primevo e, em sua ânsia em satisfazer desejos seus, não mede as consequências. Suas criações seriam monstros?



O filme Splice : a Nova Espécie trata do tema. Splice significa mistura, conjunção. E é justamente isso que o casal de cientistas fazem. A fim de sintetizarem uma proteína específica para uma empresa, realizam um experimento incorporando no pacote o DNA humano. O resultado é um misto de várias espécies. Um ser que se adapta e tenta seguir adiante em sua vida.

Há quem diga que experimentos como vistos no filme estão sendo realizados e que os resultados às vezes são noticiados (o chupa-cabras, por exemplo).  Mas saibam que os filmes não estão aí apenas para divertir através da ilusão calcada numa ficção científica impossível; fantasia advinda da cabeça de mentes criativas. São mensagens, avisos.

E desde já esteja avisado.


quarta-feira, 3 de agosto de 2011

O fim da jornada.

Horácio é um mentiroso, Frank. A confiança que você depositou nele era sem fundos.

Mas o que você me diz é muito grave! Aquele miserável! Como pode?!

Ele tramou isso com o Pépe. Faz um bom tempo que ele queria visitar os parentes do interior...

Mas... espere aí. Como você sabe sobre tudo isso?

Recursos, Frank, recursos. Bem... no mais, te digo: o terremoto ocorreu justamente porque o castelo não estava no seu local originário. Removê-lo desencadeou uma série de eventos estranhamente dramáticos, culminando neste último.

Nossa...

Por isso, espero que você compreenda a razão da necessidade e urgência em manter-se lá, pois à medida em que fica tribulando numa jornada sem sentido, e que favorece apenas um fantasma (que por preguiça não se utiliza de outros meios, até bem menos inconsequentes, de visitar seus parentes), o mundo corre perigo de esfacelar-se numa onda pandemônica crescente de caos. Fui claro?

Não poderia ter dito melhor.

Por certo, você acatará essa minha sugestão.

Certamente. Contudo, aceitei fazer companhia para o Mathias esta noite,  por isso irei amanhã pela manhã.

Desculpe, Frank, mas não pode ser. Você deve retornar imediatamente. Assim que tiver deixado o castelo em seu devido lugar, poderá visitar o Mathias quando quiser. Além do mais, sua preocupação com a solidão dele é infundada. Ele terá alguém para conversar: eu.

Bem... Sendo assim...

Após me despedir, respiro fundo. Ajeito meus pertences e trilho o caminho de volta, com a certeza de que Horácio iria pagar bem caro por ter me aprontado uma dessas.

terça-feira, 2 de agosto de 2011

A jornada: apresentando Ranter.

A voz do velho da cabana era tão melodiosa quanto a música que conseguira tirar horas antes de sua rabeca. A história de Ranter foi finalmente exposta:

Advindo de uma vila menor que a menor de nossas vilas, Ranter foi obrigado, para manter a integridade de sua morada e a dos demais moradores, a alistar-se numa guerra que de imediato não lhe afligiria mal, mas que a longo prazo com certeza repercutiria em sua vida negativamente. O local em que nascera e vivera até aquele momento, conjunto das melhores recordações de sua longa jornada, transforma-se-ia num sepulcro de escravos caso ele e praticamente todos os homens não se oferecessem para, unidos sob o julgo de um comandante, responsável em reunir todas as aldeias esparsas da vasta região em que fazia parte seu lar, lutarem determinados contra um império que se formava.


A vitória, infelizmente, não foi conseguida. Todos os que puderam, retornaram. Porém, alguns renderam-se à cobiça e decidiram auxiliar os conquistadores.

Para Ranter e os outros guerreiros, que mantiveram consistentes a humildade e a lealdade a um modo de vida em que a liberdade era uma vertente, enojaram-se com a escolha dos infelizes que agora teriam que enfrentá-los.

Houve um combate, tão sangrento quanto os presenciados no campo de batalha, contudo, a intensidade e a confluência de sentimentos liberados pelos poucos homens que ousavam desafiar o império, era estupidamente maior.

Em menor número, os defensores não tinham escolha: a morte era o único caminho. E a derrota era iminente.

Ranter, que naquela época possuía outro nome, fatigado e ferido, acabou se exilando, mas com a esperança de vingar-se dos traidores.

Foi daí que lhe aconteceu um fato surpreendente. Um ser, semelhante a um homem de fina estampa, que emitia uma aura estranha, ofereceu-lhe uma oportunidade para reaver tudo o que perdera.

Desesperado, Ranter não teve escolha. Uma vez aceita, ele sentiu uma mudança interna. Sentia-se confiante, forte. Poderia realizar tudo o que tivesse em mente.

E assim foi. Ele destruiu seus inimigos com tal ímpeto e sanguinolência que, ao fim do ato, ao ver o resultado, chorou de desgosto.

Sua melancolia atingiu níveis tão alarmantes que decidiu desistir da vida.

Quando se preparava para quedar-se num precipício, foi impedido por uma voz. Tão vasta que parecia vir de todos os lugares. Era uma nova chance. Um pacto para toda a vida.

Foi daí que conseguiu sua imortalidade?

Ele teve que cumprir algumas tarefas. Alcançando-as, foi lhe cedido a dádiva (ou não) da imortalidade. Mas o interessante é que ele poderia abnegar dela quando quisesse. Bastava copular; deixar sua semente no mundo.

Ele é obstinado, não?

Ele me disse que ainda não encontrou a pessoa certa.

E indeciso...

Você não entederia, Frank.

A última frase havia sido proferida por um ruivo de sobretudo, de quase dois metros de altura, estacionado no meio da porta.

Ranter, é você?

Sua audição continua boa, Mathias. Fico feliz por lembrar de mim.

Mas que surpresa...! O que o traz até meu humilde lar? Por acaso veio reaver a rebeca?

Claro que não, meu velho. Ela é sua. Um presente para a pessoa certa. Na verdade, vim cá para convencer nosso estimado Frank a permanecer no precipício, de onde jamais deveria ter saído.



Obs.: Ranter terá suas próprias histórias, inclusive sua origem, mais detalhada. Em breve.